quinta-feira, 8 de julho de 2010

Inóspito .

- Você não se cansa?
- De quê?, - perguntou, vazio de si.
- De tudo. De suportar o mundo.
- De como as coisas sempre parecem girar em torno do mesmo eixo e nunca mudam? - sorriu de escárnio. - Você não entenderia, você não viu tudo o que eu tive que ver. Nunca entenderia. Os olhos pairavam distantes, presos a um ponto marcado na parede amarelada pelo tempo.
- Sabe, às vezes eu penso em como seria se não tivesse sido daquele jeito. Me pergunto se nós estaríamos aqui hoje se qualquer coisa no caminho tivesse sido mudada.
Ela olhou-o calmamente:
- Você mudaria alguma coisa se pudesse voltar no tempo? - Já sabia a resposta antes mesmo de perguntar.
Silêncio e pensamentos absortos.
- Você sabe que não. Que tudo o que aconteceu nos transformou no que somos hoje e que foi necessário. Já pensei repetidas vezes sobre talvez mudar o começo, o começo de tudo, mesmo. Mas não teria como, não é? Não dependia só de mim.
Os olhos procuraram outro ponto mais distante, onde talvez ele conseguisse esconder todos os sentimentos confusos e inesperados. Todas as vezes que iniciavam essa conversa, terminavam no mesmo ponto sem sentido que todas as discussões parecem tomar.
Já haviam se acostumado com a umidade dali, mas agora uma brisa fria passava por entre os corpos, fazendo-os se sentirem inadequados naquele lugar.
Ela se aproximou.
- É verdade, eu nunca quis que mudasse.
Ele olhou-a confuso, esperando uma explicação, até que a frase se ajustou e ele pôde entender. Como uma pluma caindo sobre um tapete macio.
- Eu sei, - ele sorriu. - Ninguém queria, não é mesmo?
A medida que a noite descia e os cigarros queimavam no cinzeiro, o silêncio deixou de ser tenso para se tornar apenas agradável.
O silêncio e a fumaça e a brisa fria mantendo-os distantes.