segunda-feira, 27 de outubro de 2008

A melodia dos trilhos .

Olhava sem atenção a paisagem. Não gostava do jeito que aquilo passava diante de seus olhos.
Eram seis da tarde e, mesmo com o trem cheio, sentia-se só.
Não estava ali, junto àquela multidão de chegava aos montes.
Estava mais longe que isso. Muito mais longe que qualquer um ali.
Sentiu medo.
O trem pára, aos poucos as pessoas vão saindo. É a última estação. Sai.
Senta-se no chão, ao lado de um homem que toca violão em troca de alguns trocados.
Ele está tocando uma música conhecida agora. Chora.
Quase instantaneamente, o homem pára de tocar.
Não foi um choro desesperado. Nem ao menos emitiu som algum.
Ele não perceberia, ao menos que estivesse olhando para ela. E estava.
Olhava-a com preocupação e, depois de alguns instantes, perguntou qual era o seu nome.
Sem resposta.
Foi muito gentil, mas parou de falar quando percebeu que não conseguiria despertá-la daquela maneira.
Voltou à tocar a música que lhe fizera chorar, observando sua reação. Voltou a chorar.
Dessa vez, ele não parou. Tocou a música até o fim.
Quando a música acabou, ela já não chorava mais. Olhou-o e sorriu.
"Meu nome é Louise."
Permaneceram se observando alguns instantes, até que ela apontou o violão e pediu para tocar uma música.
Tocou. E era como se a música fosse ela, e os sons saíssem dos seus poros. Como se cada movimento dos seus cabelos fizessem parte de uma sinfonia que ele jamais ouvira antes.
E essa sinfonia era dela, compusera na viagem até ali.
Ele entendeu, e acenou com a cabeça.
"A escrevi, porque quero minha vida espalhada pelos cantos. Posso confiar isso à você ?"
Sim, é claro que poderia. Ele tocaria-a todos os dias, fazendo as pessoas à sua volta cantarem-na também.
Ela agradeceu com um sorriso e remexeu a bolsa.
Retirou um papel. Nele estavam escritos as notas, a letra. Entregou-o ao homem.
Despediu-se, o trem estava chegando. Olhou para aquele homem que acabar de conhecer e cantou o ultimo verso da música:
"Despeça-se do Sol por mim."
Jogou-se nos trilhos, sendo arrastada no mesmo instante pelo trem.
Agora, ele entendera porque a musica lhe era tão forte. `
Ela colocara sua alma nela. À cada verso que cantava, um pouco da vida lhe ia embora.
Entendera, então o porque do pavor em seus olhos. Era o próprio som da sua morte chegando mais perto, à cada acorde tocado.
E ele empenhou-se em tocar a música.
Espalhou a vida de Louise nos lugares que pôde.